Tuesday, June 14, 2005


Posted by Hello

Todos os dias ele apanhava o comboio. Saía de casa à pressa ainda com os atacadores por apertar e a agitação da noite anterior por pentear. Tinha tudo o que um homem podia desejar: uma mulher bonita que tratava dele, 3 filhos que o enchiam de orgulho e um trabalho que lhe pagava o prestígio e as extravagâncias.
Sempre que se sentava nos bancos gastos do comboio sentia o peso da idade desaparecer. As rugas escondiam-se devagarinho e dava por si com um sorriso traquina como quando em criança roubava maçãs da árvore da vizinha. Fechava os olhos e imaginava-se numa viagem espacial, prestes a derrotar os monstros que vinham invadir a Terra. Não havia gravidade e os seus sonhos voavam sem limite, conquistando planetas, dando voltas ao mundo, alncançando o infinito. Depois, abria os olhos de mansinho e sentia-se preso num universo demasiado pequeno para ele. Suspirava e o cansaço do dia que mal começara caía-lhe em cima como as vozes do coração que temia ouvir.
Seguidamente, perdia-se para lá da janela. Via a agitação da cidade e sentia a vida a fugir-lhe. Todos os dias eram iguais: as mesmas pessoas, os mesmo edificios a espreitar pela neblina da manhã, a mesma gritaria matinal, o mesmo cão sentado à beira da estrada, o mesmo candeeiro a precisar de arranjo. Todos os dias saía na mesma estação e lá estava o mendigo abandonado pela vida lutando por mais um dia. O tempo embrulhava-se e já não se lembrava de outra vida, de outros tempos, de um caminho que não o que as suas pernas seguiam sem lhe pedirem opinião.
Sempre que o comboio parava, uma força invisível lutava por arrastá-lo pela porta, em busca de um futuro desconhecido que respondia às vozes do seu coração. Uma vida cheia de novas vidas e muitas perguntas. Mas quem olhasse como atenção para o nosso homem via como apertava as suas pernas com uma força tremenda, resistindo ao impulso que o podia levar para longe do que conquistara...

mas afinal, quem quer mais perguntas quando ja tem tantas sem resposta? por que é que sonhamos noite e dia com um futuro diferente e criticamos a rotina como um defeito da alma mas nos agarramos com toda a força a cada bocadinho que achamos que nos pertence e que nos dá segurança para continuar? por que é que queremos mudar e transformar-nos num outro alguém quando no fim da vida ainda estamos a tentar perceber quem somos?

mas será que podemos estar em total segurança sem a nossa dose de liberdade? será que podemos repetir a mesma viagem para sempre? cruzarmo-nos com 50 mil outras viagens que se sentam no nosso banco da frente e que por vezes se adivinham tão mais excitantes que a nossa, e ainda assim, optar pela velha calçada que nos viu nascer?

e se um dia quiséssemos mudar de vida?

e se um dia...
... saíssemos noutra paragem?

4 comments:

Anonymous said...

ainda não li o texto.
prometo q leio + tarde, qd estiver em casa.
já de férias??? xiii... eu estou dividida entre o necessitar e o temer as férias... preciso do descanso mas dispenso a despedida.
felicíssima por me dizeres que estás melhor. estava preocupada.
eu estou em baixo. crises de asma... e o carro que não trabalhou de manhã e eu com aula re de revisões... tudo ajuda! Acho que devia de ir à bruxa.
eu prometo então que depois mostro o bebé... lol
beijos e goza essas férias

R. said...

quero sair noutra estação!

Anonymous said...

Prometi que voltava para ler o texto.
E voltei depois de um dia daqueles em que o melhor é não sair da cama (eu raramente quero sair noutra estação).
O quotidiano, as rotinas muitas vezes cansam-nos, sufocam-nos; no entanto, todo o ser humano gosta de sentir segurança do que lhe é familiar, gosta de estabilidade. É um pouco como ires a um país estrangeiro e tomares as refeições no macdonalds: sabes o que podes comer ali, do que gostas ou não.
Contudo, é humana a vontade de ir mais além. A cada passo dado o horizonte fica mais longe e tendes a alcançá-lo, mas ele foge-te cada vez mais... é esse o segredo da nossa ambição, da nossa vontade de caminhar, mas sempre sempre com os pés no chão, porque voar faz parte do desconhecido.
Beijos, Joana.

Anonymous said...

simplesmente,adorei (: