Saturday, January 14, 2006



atraso o relógio. 5 minutos. 5 minutos apenas. é o que me basta para saber que ainda estás aqui, que não foste levado pela corrente. 1,2,3,4,5 minutos. intensos. tenho-te no desespero de te perder. não te amo. re-amo-te. já não te sei amar. só te soube amar há 10 minutos. agora não. mas quero, quero tanto. o relógio avança ponteiro a ponteiro num desalmar ensurdecedor. falta pouco, sei. arranco as pilhas, parto o vidro, salto em cima do relógio. em vão. passam os 5 minutos. acabou.

[para quê viver o passado quando nos persegue com uma faca na mão?]

adianto o relógio. 5 minutos. sabe bem. o ponteiro sorri-me irónico pensando que me tirou 5 minutos de existência. não sabe que o traí. quase nunca ninguém sabe que é traído. descanso pensando em todo o tempo que me resta, em todos os amores que virão e em quantas vezes poderei enganar assim o tempo. não te amo. tenho tempo que sobre. talvez um dia... [nem desconfio que é o tempo que me engana a mim].

[para quê viver o futuro quando vai acabar por nos matar?]

meu amor, vamos viver agora?
ensinas-me a amar?

Tuesday, January 03, 2006

Fecha-se o pano e a cabeça anda à roda. ao longe um ruído insistente, como se duas espadas se cruzassem no limiar de uma batalha. mais uma vez. e outra. por que batem palmas? com ansiedade, desembrulham-se os laços atados à pressa numa busca incessante de segurança. abre-se o último, nada. talvez precise de tempo para se manifestar, pensa-se. passa uma hora, duas, vinte e quatro. mas os cadeados desmaiam em fragilidade e a porta fica entreaberta. e não, a segurança não está à espreita. perguntas olham-nos de baixo em almas que parecem tão mais em cima. querem saber onde ela foi, se é nesta fase que se esconde. mas a segurança não se mostra a quem tem medo de não a ter. e os sentimentos revoltam-se. passeiam em turbulência por um corpo despido e fazem muito barulho, com cartazes enormes e holofotes salgados.
- Não há condições - reclamam. - Sem segurança não podemos trabalhar. E depois de horas de greve, cansam-se e começam a fazer as malas preparando-se para partir. E são muitos. A força, a coragem, a vontade, a confiança. Caminham com força e pisam o corpo em pegadas daquelas que as crianças gostam de fazer quando o alcatrão está fresco. E partem em direcção à fronteira deixando para trás o medo e outros que como ele têm medo de partir. À medida que se aproximam vai aumentando a catástrofe. A eles junta-se o sonho e a esperança e quase já se vê o fim daquela alma que se está a perder. Chegam à fronteira e preparam-se para a ultrapassar. Mas hesitam. Lembram-se da segurança que os deixou e sentem que também outros sentimentos terão que desistir quando derem aquele passo. Depois pensam que sem eles a segurança nunca mais irá voltar. E viram-se para trás, mais fortes, mais maduros, prontos para reocupar todo aquele corpo que quase naufragava.
Ouvem-se novamente as palmas. Mais fortes, assemelham-se agora ao bater do coração.
Talvez não haja segurança.
Mas não posso deixar que os outros sentimentos desistam também.